Dia 11 – Philippe
As aparências enganam. Não que o local não fosse aconchegante ou convidativo, mas a minha ideia de restaurante francês, obviamente contaminada, continha mais luxo, mais glamour. Claro, pura bobagem.
O restaurante Philippe, que por coincidência fica muito próximo ao Hocca, já anteriormente citado, fica na Rua Normandia, em Moema.
Ao estacionarmos, um senhorzinho apareceu para nos ajudar. Obviamente ele queria tomar conta do carro em troca de algumas notas ou moedas. Sim, eu sei que não deveríamos pagar para estacionar na rua e, normalmente, procuramos outro lugar para deixar o carro, nem que seja um estacionamento. Já que vamos pagar, que seja merecido. Mas olhando para aquele homem, tão simples, já idoso, não consigo deixar de pensar na situação do nosso país. Não consigo deixar de me compadecer por essas pessoas não poderem se dar ao luxo de ficar em casa, sentadas em um confortável sofá, assistindo a seus programas favoritos e tomando uma taça de vinho ou uma cerveja gelada.
Sei que trabalhei duro minha vida inteira para poder ter esse prazer de agora frequentar meus restaurantes favoritos ou até mesmo de não fazer nada e apenas curtir os meus momentos. Nem por isso meu coração deixa de se condoer por pessoas que talvez não tenham tido – e provavelmente não tiveram - as mesmas oportunidades que eu, os mesmos valores, a mesma motivação, disposição, incentivo.
Enquanto nos dirigíamos ao restaurante, meu marido confessou que não tinha nenhum dinheiro na carteira. Mas quem carrega dinheiro, hoje em dia? Fiquei chateada por não poder ajudar o senhorzinho, mas não tínhamos previsto essa situação.
A frente do restaurante já me agradou. Diversas mesas na calçada davam um aspecto pitoresco e charmoso. Dentro já era mais simples, agradável, porém não tão charmoso. Mesmo assim, preferimos ficar do lado de dentro, mais fresco. O ar abafado do fim de um dia de imenso calor não nos deixaria aproveitar a noite como ela merecia.
O simpático garçom nos trouxe imediatamente o menu. Tantas opções e todas parecendo realmente deliciosas, da entrada à sobremesa.
Pedimos, de entrada, crostini de queijo de cabra, presunto cru, rúcula, balsâmico e nozes. Cada ingrediente se destacou em minha boca individualmente e, ao mesmo tempo, a combinação de todos foi uma explosão de sabores, tal qual em uma orquestra, onde é possível escutar o conjunto musical, mas também perceber como cada som contribui separadamente. Era impossível escolher apenas um como o vencedor para o meu paladar.
Em seguida, pedi o Filet au poivre, enquanto meu marido escolheu o Penne al limone com presunto cru desfiado. Como eu adoro pimenta, fiquei imensamente satisfeita ao descobrir que eram poderosíssimas. A carne estava extremamente macia, derretendo-se lentamente em minha boca, enquanto o sabor era delicadamente apreciado. Tudo perfeito, como se espera de um restaurante francês de peso.
Quanto ao penne, o bocadinho que experimentei quase me fez querer trocar os pratos. Quase. Analisando ambas as iguarias, meu filé ganhou, mas por muito pouco.
Infelizmente, mais uma vez fomos gulosos, não deixando espaço para a sobremesa. Mas pensei em pedir uma para dar ao tomador de conta. Pelo menos ele não sairia de mãos vazias e eu não estaria dando dinheiro e, sim, comida.
Meu plano, no entanto, fracassou. Não havia nenhuma sobremesa que pudesse ser levada para viagem. Todas teriam que ser consumidas na hora, na mesa, por envolverem sorvetes e/ou flambagem. Pedir qualquer outra coisa demoraria demais e já estava tarde.
Uma pena, mas como pretendo voltar ao Philippe, espero me redimir com o pobre homem que, aliás, mesmo sabendo que não ganharia nada, ainda nos ajudou com a manobra para tirar o carro da vaga apertada.
Sim, as aparências enganam. Olhamos um homem pobre, malvestido, com mais idade, fazendo um serviço que desprezamos e já tecemos toda a sua vida como um bordado sem valor. O mundo deveria ser como o filme O amor é cego, onde pudéssemos ver refletida na pessoa sua beleza interna.
Quanto ao restaurante, embora sua aparência não tivesse todo o glamour que eu esperava, o atendimento e o sabor foram puro luxo, pura sofisticação.
E não é isso que realmente importa?
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